Correcção da Prova de Avaliação (2.º ano)

[1] Análise harmónica dos seguintes excertos retirados de Corais harmonizados por J. S. Bach:

Enunciado A

***Sol M: Ia | IVa Va Via Vb | II7a Va Ia Vb | Ia IVb Ib IVa | Va _ Ia ||

Enunciado B

***Mib M: Ia Va Via Vb | Ia Ib Va _ | Ia _ Vb Ia | IVb Ia IVa Ib | Va _ Ia ||

Enunciado C

***Sol M: Ia | Ia Vb Ia IVa | Ib Va Ia IVa | Va IVb Ia IVb | II7b Va Ia ||


[2] Existem os seguintes erros na realização abaixo transcrita:


  1. No 1.º tempo do 1.º compasso: acorde sem 3.ª;
  2. Do 2.º para o 3.º tempo do 1.º compasso, entre Baixo e Contralto: 5.ªs consecutivas;
  3. No 3.º tempo do 1.º compasso: acorde sem 3.ª:
  4. Do 4.º tempo do 1.º compasso para o 1.º tempo do 2.º compasso, entre Baixo e Soprano: 5.ªs consecutivas (5.ª diminuta para 5.ª perfeita);
  5. No 2.º tempo do 2.º compasso, entre o Baixo e o Soprano: 3.ª de acorde duplicada sem a necessária preparação;
  6. Do 2.º para o 3.º tempo do 2.º compasso, entre o Tenor e o Soprano: 5.ªs consecutivas;
  7. No 4.º tempo do 2.º compasso, no Tenor: 7.ª de acorde da dominante resolvida de forma ascendente;
  8. Do 1.º para o 2.º tempo do 3.º compasso, entre o Baixo e o Tenor: 5.ªs consecutivas;
  9. No 4.º tempo do 3.º compasso, entre Contralto e Soprano: duplicação de 3.ª em acorde da dominante.

[3] Tendo por base uma partitura em anexo ao enunciado da respectiva prova, era pedida a resposta sucinta a duas questões:
  1. Análise formal da referida partitura;
  2. Indicação da forma e do autor provável da mesma (Sonata Kv 332, 1.º andamento, de Mozart).
[4] Nos três enunciados, as afirmações efectuadas são fundamentalmente equivalentes entre si, diferindo, contudo, na respectiva redacção, fazendo com que nuns casos as mesmas sejam verdadeiras e noutros falsas. Assim, se todas as afirmações aí referidas fossem verdadeiras, as mesmas teriam uma redacção semelhante à a seguir indicada:
  1. O uso de acorde de sétima da dominante, na segunda inversão, não obriga à preparação, mas somente à resolução, da quarta que se forma entre o baixo e a voz que tem a fundamental do acorde.
  2. A diferença existente entre a forma de rondo e a forma de ritornello, é que, enquanto que na primeira as repetições do tema se fazem sempre na tónica, na segunda as repetições do tema se fazem em tonalidades próximas da tónica, à excepção da primeira e última apresentação do tema que é efectuada na tónica.
  3. A forma sonata evolui a partir da forma binária utilizada na generalidade das danças que constituem a suite barroca.
  4. Não é permitido duplicar a terceira do acorde da dominante de uma tonalidade independentemente das circunstâncias em que tal duplicação seja efectuada.
  5. Durante a segunda metade do século XVIII é regra que a exposição da forma sonata seja sempre repetida, sendo a mesma identificável através de uma barra dupla, com indicação de repetição, que marca o seu fim.
  6. A forma de tema e variações usada durante o classicismo segue de perto o modelo organizacional que já podemos encontrar nas Variações Goldberg de J. S. Bach.
  7. A sétima de um qualquer acorde, quando utilizada, pode ser resolvida por movimento melódico descendente por grau conjunto numa consonância.
  8. Entre as dissonâncias ornamentais possíveis de utilizar no baixo, temos a nota de passagem e o ornato.
  9. A nota de passagem e o ornato tanto podem ser utilizados na subdivisão forte como na subdivisão fraca do tempo.
  10. Numa realização a quatro vozes, no acorde de nona da dominante na primeira inversão, é usual omitir-se a fundamental deste acorde.

Correcção da Prova de Avaliação (1.º ano)

[1] Existem os seguintes erros nas realizações de contraponto abaixo transcritas:
  1. Do 3.º para o 4.º compasso, falta compensar o intervalo melódico de 4.ª;
  2. No 4.º compasso, 2.º tempo, o Fá é uma escapada (isto porque não é possível ter no mesmo compasso, do ponto de vista harmónico, a 5.ª e a 6.ª como consonâncias);
  3. No 5.º compasso, 2.º tempo, tempos explicitamente um acorde de 5.ª diminuta no estado fundamental;
  4. No 6.º compasso temos a sugestão de um acorde na 2.ª inversão;
  5. Do 6.º para o 7.º compasso falta compensar o intervalo melódico de 3.ª maior.


  1. Entre a 4.ª semínima do 2.º compasso e a 3.ª semínima do 3.º compasso não existe um mínimo de quatro semínimas a separar estas duas oitavas;
  2. No 4.º compasso é utilizado o esquema CDDD (este não faz parte dos esquemas permitidos na 3.ª espécie);
  3. Do 4.º para o 5.º compasso existe a repetição de uma mesma nota (Lá) na mesma oitava;
  4. Da 2.ª para a 3.ª semínima do 7.º compasso temos o intervalo melódico de 6.ª maior;
  5. Do 9.º para o 10.º compasso existem 8.ªs consecutivas.

[2] Exemplos de realização de contraponto rigoroso na quinta, segunda e primeira espécies.

a) Quinta espécie


b) Segunda espécie


c) Primeira espécie



[3] Em ambos os testes as perguntas neste terceiro grupo são equivalentes. Assim, na questão a) deveria ser dito que as vozes referenciadas utilizavam um processo isorrítmico, explicando a forma como o mesmo funcionava em cada uma das peças em anexo. Na questão b), em ambas as provas, era para referir que se tratava de uma cadência de dupla sensível. Na questão c), no Enunciado A, tratava-se também de uma cadência de dupla sensível, mas em que o movimento do tenor era interrompido por uma pausa pertencente à talea do tenor, pelo que ambas as vozes superiores ornamentam melódicamente as notas Fá# e Dó# antes de resolverem, respectivamente, nas notas Sol e Ré quando surge o Sol no tenor logo após a referida pausa. No Enunciado B, esta questão c) era para responder que as duas secções referenciadas eram musicalmente iguais, só diferindo no respectivo texto. Na questão d), no Enunciado A, era para referir que se tratava do motete Garrit Gallus/In Nova Fert/Neuma de Phillipe de Vitry e, no Enunciado B, era para referir que se tratava do Agnus Dei da Missa de Notre Dame de Guillaume de Machaut.


[4] Em ambos os enunciados, as afirmações efectuadas são equivalentes, diferindo, contudo, na respectiva redacção, fazendo com que nuns casos as mesmas sejam verdadeiras e noutros falsas. Assim, se todas as afirmações aí referidas fossem verdadeiras, as mesmas teriam a seguinte redacção:
  1. É possível utilizar os acordes perfeito maior e menor no estado fundamental e na primeira inversão, e o acorde de quinta diminuta somente na primeira inversão.
  2. Estão proibidas das sucessões harmónicas de quintas e de oitavas, bem como as sucessões harmónicas de mais do que três terceiras ou sextas.
  3. É proibido escrever um fragmento melódico cujos extremos produzam o intervalo melódico de quarta aumentada.
  4. São possíveis de realizar qualquer um dos seguintes intervalos melódicos: segundas menores e maiores; terceiras menores e maiores; quarta perfeita; quinta diminuta e quinta perfeita; sexta menor; e oitava perfeita.
  5. Estão proibidas as marchas melódicas, i.e., a repetição sucessiva de um mesmo trecho melódico em graus diversos da escala.
  6. Na segunda espécie, quando o cantus firmus se encontra na voz superior, não é possível efectuar o intervalo melódico de quarta perfeita do primeiro para o segundo tempo do compasso.
  7. Na terceira espécie pode-se utilizar, como forma de justificar o uso de duas dissonâncias consecutivas, a dupla nota de passagem, o duplo ornato, e a cambiata.
  8. Na quinta espécie é obrigatório (e, como tal, possível), a meio de um compasso, passar da terceira para a quarta espécie.

Enunciado das Provas de Avaliação (2.º Período)

Para o total das turmas por mim leccionadas elaborei, neste segundo período referente ao ano lectivo de 2008/09, cinco enunciados diferentes, dois para o primeiro ano e três para o segundo. De seguida, coloco à disposição de todos os interessados os referidos enunciados, indo apresentar a respectiva resolução dos mesmos em tópicos à parte para cada um dos dois anos da disciplina de Análise e Técnicas de Composição.

1.º Ano

2.º ano

A construção de um novo sistema harmónico no Século XV

Com a transição do Século XIV para o Século XV, e na sequência das enormes convulsões sociais e políticas que avassalam a Europa de então, surge na Europa Continental, em grande parte por influência Inglesa, um novo tipo de harmonia baseada numa concepção mais integradora do conjunto harmónico, a qual contrasta com o sistema harmónico até então utilizado, baseado sobretudo no intervalo e na utilização de várias camadas harmónicas sobrepostas, cada uma constituída por um par de vozes. Vai ser com a chamada Guerra dos 100 anos -- normalmente situada pelos historiadores entre 1337 e 1453, e desencadeada por uma questão na sucessão dinástica do trono francês a quando da morte de Carlos IV, em 1328 --, que surge na Europa Continental uma forte influência Inglesa, nomeadamente com a adopção de uma técnica de chamado falso bordão -- expressão derivada provavelmente do francês medieval fors bordon --, que consiste na harmonização de uma melodia por uma sucessão de terceiras e sextas harmónicas, dando origem à sucessão daquilo que hoje consideramos ser um conjunto de acordes triádicos na primeira inversão.
Na comparação da música escrita por compositores do chamado período da Ars Nova, ainda no Século XIV -- como é o caso de Guillaume Machaut (ca. 1300 a 1377) --, e de compositores da primeira geração franco-flamenga -- como Guillaume Dufay (1397 a 1474) --, ou que directamente a influenciaram -- como é o caso de John Dunstable (ca. 1390 - 1453) que esteve ao serviço do Duque de Bedford entre 1422 e 1435 durante o período em que este é regente de França --, nota-se uma clara diferença na forma como a harmonia é construída, marcando este um período de clara mudança no estilo musical praticado na Europa Continental. Esta diferença situa-se em grande parte numa alteração profunda na forma como a harmonia do conjunto de vozes é concebida, algo que, para além de implicar numa alteração nítida da sonoridade produzida pelo conjunto de vozes, em grande parte deriva a sua génese da influência produzida pela técnica de falso bordão. Claro que hoje se torna um pouco difícil estabelecer uma clara relação de casualidade entre o aparecimento desta técnica e esta transformação sentida na forma como a harmonia passa a ser engendrada no Século XV. Mas não deixa de ser nítido o paralelo existente entre ambos os processos históricos aqui referenciados.
A este propósito, ouça de forma crítica e comparativa, os seguintes exemplos de obras de compositores dos Séculos XIV e XV acima referenciados:

1. Guillaume de Machaut. Missa de Notre Dame: Agnus Dei


2. Guillaume de Machaut. Rose, Liz, Printemps, Verdure


3. John Dunstable. Ave Maris Stella


4. John Dunstable. Beata Mater a 3 voci


5. Guillaume Dufay. Tibi, Christe, Splendor Patris


6. Guillaume Dufay. Missa para Santo António de Pádua: Kyrie

Sinfonia n.º 104, 1.º andamento, de Haydn

O primeiro andamento da Sinfonia n.º 104 de Joseph Haydn (Londres, 1795) é composto numa tradicional forma sonata (allegro) precedida de uma introdução (adagio), a qual não faz parte da primeira. Enquanto o allegro se encontra em Ré maior, o adagio que o antecede está em Ré menor, sendo este construído numa forma ternária (ABA), nas tonalidades de Ré menor, Fá Maior, e Ré menor.
Apesar da sua qualidade não ser a melhor, o video a seguir apresentado mostra a execução deste primeiro andamento desta sinfonia:



A estrutura macro-formal deste andamento divide-se da seguinte forma (as secções encontram-se referenciadas por compasso):

1 a 16 Introdução
17 a 124 Exposição
124 a 192 Desenvolvimento
193 a 294 Reexposição

Quanto à constituição de cada uma destas macro-secções, temos:

[a] Exposição
17 a 32 T1 a [Ré maior]
32 a 39 T1 b
40 a 64 Ponte
65 a 80 T2 a [Lá Maior]
80 a 99 T2 c
99 a 112 T2 d
112 a 123 Coda

[b] Desenvolvimento
124 a 146 T1 a (ou T2 a)
146 a 155 T2 d
156 a 192 T1 a (ou T2 a)

[c] Reexposição
193 a 208 T1 a [Ré maior]
208 a 215 T1 b
216 a 247 Ponte
247 a 257 T2 a [Ré maior]
257 a 266 T2 c
266 a 277 T2 d
277 a 294 Coda

Apontamentos diversos:
  1. Como é comum em algumas formas sonata da segunda metade do Século XVIII, o segundo tema (T2) é em parte constituído por material idêntico ao primeiro tema (T1), à excepção do contraste tonal que, numa tonalidade maior, é efectuado entre a tónica e a dominante na exposição da referida forma. Na reexposição este contraste de tonalidade é inexistente, vindo ambos os temas na mesma tonalidade, i.e., na tónica. Assim, a primeira de duas frases do primeiro tema (T1), bem como a primeira de três frases do segundo tema (T2), são na realidade constituídas pelo mesmo material musical. Na verdade, neste período da história da música erudita ocidental, mais importante do que o contraste entre dois materiais de carácter distinto, é a existência de um claro contraste entre duas diferentes áreas tonais, uma na tónica e outra na dominante, ou relativo maior da tónica, consoante a tonalidade principal do andamento seja, respectivamente, em modo maior ou em modo menor.
  2. No final da ponte, na reexposição, ainda antes da entrada do segundo tema (T2), parece existir uma breve interrupção desta secção com um breve retorno ao desenvolvimento. Tal prática é comum em Haydn que, neste e em alguns outros aspectos, apresenta alguma regular inregularidade na concepção das suas formas sonata onde, na reexposição, por vezes a interrompe a mesma de uma forma semelhante ao que aqui acontece.